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A Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais (TNU) decidiu que o transporte de combustíveis, quando realizado nos moldes do artigo 193, inciso I, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e da Norma Regulamentadora nº 16 (NR-16), é suficiente para caracterizar atividade perigosa e, portanto, apta a ensejar o reconhecimento de tempo especial para fins de aposentadoria, mesmo sem menção expressa de periculosidade no PPP. Essa decisão é especialmente relevante para motoristas de caminhão-tanque, que enfrentam resistência administrativa na hora de averbar o tempo especial junto ao INSS.
Entenda o caso
O processo analisado envolvia um segurado motorista de caminhão-tanque que teve negado, pela Turma Recursal da Justiça Federal de São Paulo, o reconhecimento de tempo especial nos períodos de 1995 a 2004 e de 2007 a 2019. A negativa se baseou no fato de que o PPP (Perfil Profissiográfico Previdenciário) não indicava o “fator de risco periculosidade”, além do entendimento de que, após 05/03/1997, o enquadramento por presunção não seria mais possível.
No entanto, o segurado interpôs pedido de uniformização apontando divergência com precedentes da própria TNU, que já havia admitido o reconhecimento da periculosidade em situações semelhantes.
A relatoria do caso ficou com a Juíza Federal Lilian Oliveira da Costa Tourinho, e a sessão virtual ocorreu entre os dias 17 a 23 de setembro de 2025, sob presidência do Ministro Rogério Schietti Machado Cruz.
O que diz a tese firmada pela TNU
“O transporte de combustíveis, exercido nos termos do art. 193, I, da CLT e da NR-16 da Portaria 3.214/78, constitui atividade perigosa apta a caracterizar tempo especial para fins previdenciários, mesmo após 05/03/1997, desde que exercida de forma habitual e permanente, com comprovação em PPP ou LTCAT.”
Na prática, isso significa que não é necessária a indicação expressa da palavra “periculosidade” no PPP, desde que fique claro, pela descrição das atividades, que o segurado atuava de forma habitual e permanente no transporte de inflamáveis, como gasolina, óleo diesel, etanol ou outros combustíveis.
A Turma baseou-se principalmente em três pilares normativos:
Art. 193, I, da CLT – Considera perigosas as atividades com exposição a inflamáveis.
NR-16 da Portaria 3.214/78 – Classifica como perigosas as atividades de transporte de líquidos inflamáveis ou gases liquefeitos.
Precedente da própria TNU (PEDILEF 0008265-54.2008.4.04.7051/TNU) – Já reconhecia o transporte de combustíveis como atividade perigosa com base na legislação trabalhista, bastando comprovação por documentos como o PPP ou o LTCAT.
O reconhecimento do tempo especial é fundamental para que o segurado possa:
- Aposentar-se mais cedo, com redução do tempo mínimo de contribuição;
- Converter tempo especial em comum (para períodos anteriores à reforma da Previdência – EC 103/2019), o que pode antecipar o direito à aposentadoria;
- Aumentar o valor do benefício em certos casos.
Para motoristas de caminhão-tanque, essa decisão representa uma vitória, pois, mesmo quando o PPP é omisso quanto ao fator de risco, será possível comprovar a periculosidade com base na descrição das atividades e na legislação trabalhista vigente.
Importante: limite da decisão e observação do voto vencido
O Juiz Federal Ivanir Cesar Ireno Junior, embora tenha acompanhado a relatora, fez ressalvas importantes: ele entende que a TNU não deveria decidir sobre atividades periculosas após 05/03/1997 enquanto o Tema 1209 do STF ainda estiver pendente de julgamento. Ele também sugeriu que a tese fosse limitada até a entrada em vigor da Reforma da Previdência (EC 103/2019), que passou a restringir o reconhecimento de tempo especial à exposição direta a agentes físicos, químicos ou biológicos.
Portanto, embora a tese seja favorável, é possível que o STF venha a modular seus efeitos em julgamentos futuros.
O que muda na prática para advogados e segurados
Advogados previdenciaristas podem usar essa decisão como tese estratégica em ações judiciais para reconhecimento de tempo especial, mesmo com PPPs incompletos ou mal preenchidos.
Segurados motoristas de caminhão-tanque devem guardar cuidadosamente contratos, holerites, PPPs e laudos técnicos que demonstrem sua atuação no transporte de combustíveis.
Em revisões de aposentadoria, essa decisão pode ser usada para buscar recálculo do benefício, especialmente se parte do tempo de contribuição foi desconsiderado como especial.
A decisão da TNU reforça o entendimento de que a realidade do trabalho deve prevalecer sobre a formalidade do PPP. Mesmo que a empresa não registre corretamente os riscos, o trabalhador não pode ser penalizado quando os documentos deixam claro que ele atuava no transporte de materiais perigosos.
Para advogados previdenciaristas e segurados, trata-se de um precedente forte, especialmente em tempos em que o INSS tende a negar o reconhecimento de atividades especiais com base em detalhes técnicos. O entendimento da TNU facilita a comprovação e pode impactar milhares de processos em todo o Brasil.
A decisão da TNU representa um avanço importante na proteção dos direitos dos segurados que atuam com atividades perigosas, como o transporte de combustíveis. Mesmo que o PPP não mencione expressamente a periculosidade, é possível buscar o reconhecimento do tempo especial, desde que a documentação comprove a natureza da atividade.
Para quem trabalha ou trabalhou como motorista de caminhão-tanque, essa decisão abre caminho para revisar o tempo de contribuição, antecipar a aposentadoria ou melhorar o valor do benefício.
Se você atua nessa área ou conhece alguém nessa situação, é fundamental contar com orientação jurídica especializada para analisar os documentos e avaliar a viabilidade do reconhecimento do tempo especial — especialmente em períodos posteriores a 1997, quando o INSS tem adotado critérios mais restritivos.
Nosso escritório está atento às mudanças na jurisprudência previdenciária e pronto para oferecer apoio técnico em casos de tempo especial, aposentadoria e revisão de benefícios.
Fonte: IEPREV















