
Imagem: Freepik
Viver com um benefício por incapacidade temporária, antigo auxílio-doença, raramente significa estabilidade financeira. Na prática, muitas pessoas enfrentam despesas que não cessam com o afastamento do trabalho: aluguel, alimentação, medicamentos, tratamentos e custos básicos que continuam existindo mesmo quando a renda diminui drasticamente. É nesse contexto que surge, com frequência, a ideia de complementar a renda por meio de pequenos bicos, vendas informais ou atividades online, muitas vezes vistas como inofensivas ou invisíveis. No entanto, do ponto de vista previdenciário, essa decisão pode trazer consequências sérias.
O benefício por incapacidade é concedido pelo INSS quando o segurado se encontra total e temporariamente incapacitado para o trabalho ou para sua atividade habitual. Esse é o fundamento jurídico do benefício. Ele não é um auxílio parcial, nem uma complementação de renda, mas uma substituição temporária da remuneração justamente porque o trabalho está juridicamente impedido. A incapacidade não se limita ao vínculo formal de emprego, mas alcança qualquer atividade que revele capacidade laboral e geração de renda.
É nesse ponto que começam os problemas. Para o INSS, não importa se a atividade é exercida em casa, pelo celular, poucas horas por dia ou de forma informal. O que se analisa é a existência de atividade econômica, ainda que não registrada, com habitualidade, organização e finalidade lucrativa. Vendas em plataformas digitais, como Shopee, Mercado Livre, redes sociais ou WhatsApp, normalmente envolvem anúncio de produtos, negociação, embalagem, envio, controle de pedidos e recebimento de valores. Esses elementos, quando presentes de forma contínua, são interpretados como exercício de trabalho, ainda que não exista carteira assinada ou CNPJ.
Sob o ponto de vista técnico e jurisprudencial, o exercício de atividade remunerada durante o recebimento do benefício por incapacidade pode ser entendido como prova de que o segurado possui capacidade laboral, ainda que parcial, o que é incompatível com o pressuposto que justificou a concessão do benefício. As consequências possíveis vão desde a cessação do benefício até a cobrança de valores recebidos de forma considerada indevida, podendo, em situações mais graves, haver questionamentos administrativos ou judiciais.
É importante dizer, com clareza e empatia, que a maioria das pessoas que tenta complementar renda enquanto está afastada não age com intenção de fraude. Age por necessidade. Age para sobreviver. O sistema previdenciário, porém, não trabalha com critérios emocionais ou sociais, mas com parâmetros legais rígidos, que muitas vezes não acompanham a complexidade da realidade econômica de quem depende do benefício. Reconhecer a dificuldade financeira não altera a regra jurídica, mas torna ainda mais necessária a informação correta para evitar prejuízos maiores.
Há situações muito específicas em que o risco pode ser menor, como a venda esporádica de bens pessoais usados, sem habitualidade, sem organização e sem objetivo comercial. Ainda assim, não existe segurança absoluta. Cada caso é analisado individualmente, e a interpretação pode variar conforme as provas existentes. Quando há repetição, lucro, estrutura mínima de venda e continuidade, o risco previdenciário aumenta de forma significativa.
Do ponto de vista jurídico, os caminhos mais seguros passam sempre pela informação e pela cautela. Se houve melhora no quadro de saúde, o correto é solicitar nova perícia ao INSS. Se existe dúvida sobre o que pode ou não ser feito, a orientação jurídica especializada é indispensável antes de qualquer tentativa de geração de renda. Apostar na informalidade como forma de invisibilidade é um erro comum, especialmente em um cenário de cruzamento de dados cada vez mais sofisticado.
Este não é um discurso de medo, mas de alerta. O benefício por incapacidade existe para proteger quem não pode trabalhar. Quando ele é colocado em risco por decisões tomadas sem orientação, o prejuízo pode ser muito maior do que o alívio financeiro momentâneo. Empatia e técnica precisam caminhar juntas. A dificuldade financeira de quem está afastado é legítima, mas a legislação previdenciária não permite a conciliação entre benefício por incapacidade e atividade econômica remunerada, ainda que informal ou digital. Em matéria previdenciária, informação não é excesso de cuidado. É proteção.
Texto adaptado: Patrícia Steffanello | Assessoria de Comunicação
Fonte: IBDP















